Cogumelos sagrados na história dos povos mesoamericanos

No começo do século XX, a ciência descobriu que os cogumelos sagrados contém psilocibina e psilocina, compostos químicos responsáveis por muitos de seus efeitos psicodélicos, agora, estudos modernos sugerem que a ingestão de psilocibina pode ser benéfica no tratamento da ansiedade e da depressão, além de encontrar aplicação em práticas contemporâneas. Porém, seu uso ancestral remonta vários séculos atrás.

Os cogumelos sagrados eram reconhecidos como forças importantes em algumas civilizações mesoamericanas. Há séculos, os povos mesoamericanos (região da América central) acreditavam que esses cogumelos eram portadores de propriedades espirituais e curativas, principalmente no México. Os astecas, maias, zapotecas e olmecas utilizaram cogumelos psilocibinos em cerimônias religiosas para se comunicar com os deuses e alcançar estados alterados de consciência.

evidências arqueológicas de que cogumelos mágicos foram usados por várias civilizações mesoamericanas pré-colombianas, incluindo astecas, zapotecas, maias e olmecas. Para esses povos, os cogumelos sagrados desempenhavam um papel central em rituais religiosos, sendo vistos como portais para o mundo espiritual.

Esculturas maya Pedras de cogumelos
Pedras de cogumelos pré-clássicas encontradas em sítio arqueológico maia, em Kaminaljuyu, Peru. (Imagem: L. Makra)

Teonanacátl

As imagens de cogumelos são muito presentes na arte e na arquitetura das civilizações asteca e maia. Essas representações geralmente simbolizam a conexão entre o reino terreno e o divino.

Os astecas, por exemplo, referiam-se aos cogumelos mágicos como teonanácatl (literalmente “cogumelo do deus” – composto das palavras teo(tl) (deus) e nanácatl (cogumelo)), pois trazia visões divinas e permitia a comunicação com os deuses. Eles o usavam em cerimônias religiosas como uma forma de honrar suas divindades e garantir a fertilidade da terra.

O termo teonanacatl não se refere a uma única espécie de cogumelo, mas sim a um grupo de cogumelos psicodélicos, a maioria dos quais pertence ao gênero Psilocybe. Isso inclui espécies como Psilocybe mexicana, Psilocybe aztecorum e Psilocybe zapotecorum, entre outras. Cada espécie contém os compostos psicoativos psilocibina e psilocina, responsáveis pelos efeitos de alteração da mente dos cogumelos.

Os zapotecas usavam cogumelos com psilocibina de maneiras semelhantes, em cerimônias xamânicas para entrar em contato com seus antepassados e obter cura. Do mesmo modo, na cultura maia, os cogumelos eram considerados sagrados e usados em rituais de purificação e renovação. Já os olmecas, considerados os precursores da civilização mesoamericana, utilizavam os cogumelos sagrados em rituais de adivinhação e para curar doenças.

Alguns astecas bebiam chocolate e comiam os cogumelos mágicos com mel. Além disso, aqueles que participavam das cerimônias com cogumelos Psilocybe jejuavam antes de ingerir o sacramento. O ato de ingerir cogumelos é conhecido como monanacahuia, que significa um tipo de unificação com as energias do cogumelo.

Rituais ancestrais com cogumelos

Cogumelos com psilocibina foram utilizados em diversos rituais ancestrais em diferentes culturas mesoamericanas, fazendo parte de cerimônias religiosas e curandeiras. No entanto, a utilização desses cogumelos sagrados também envolvia práticas polêmicas, como os sacrifícios humanos.

“Acreditava-se que o sacrifício humano era uma oferta para os deuses e que, por meio dessa prática, era possível acessar o teonanacatl de forma mais profunda e completa” – Carlos Castañeda.

Os rituais faziam parte de um contexto espiritual, em que se acreditava que os cogumelos permitiam a comunicação com deuses e ancestrais, além de levar a experiências transcendentais.

Entre os astecas, por exemplo, eles utilizavam o teonanacatl em cerimônias que envolviam cantos, danças e oferendas. Acreditavam que o consumo dos cogumelos levava os participantes a um estado de união com o divino.

A presença dos fungos psicodélicos em rituais antigos também está ligada a práticas de cura. De acordo com os zapotecas, os cogumelos sagrados possuíam propriedades medicinais, e suas substâncias ajudavam no tratamento de diversas doenças.

Cogumelos mágicos na mesoamérica

CivilizaçãoRituais com cogumelos sagrados
AstecasCerimônias religiosas e rituais de sacrifícios humanos
ZapotecasCerimônias xamânicas para cura e contato com antepassados
MaiasRituais de purificação e renovação
OlmecasRituais de adivinhação e cura de doenças

O uso dos cogumelos foi tão significativo para esses povos que muitos dos cogumelos sagrados foram representados em artefatos e monumentos, e até mesmo em códices e manuscritos antigos.

Teonanacatl cogumelos mágicos astecas
Códice magliabechiano, antigo documento Asteca, faz referências ao teonanacatl. (Imagem: BN Centrale)

A colonização espanhola reprimiu severamente o uso dos cogumelos psilocibinos, apesar de sua importância cultural e espiritual para os povos mesoamericanos. Ainda assim, os conhecimentos e práticas relacionados a esses cogumelos sagrados continuam sendo passados de geração em geração em algumas comunidades indígenas da região.

Com a chegada dos colonizadores espanhóis no México, houve uma mudança drástica na percepção e uso dos cogumelos pelos povos mesoamericanos.

Antes da colonização, os cogumelos sagrados faziam parte de rituais religiosos importantes, sendo reconhecidos por sua importância espiritual e curativa. No entanto, a influência cultural europeia trouxe a discriminação e a criminalização do uso do teonanacatl pelos indígenas.

Ao longo dos séculos, a colonização espanhola e a subsequente influência cultural europeia levaram à marginalização e proibição do uso do teonanacatl. A religião cristã, trazida pelos colonizadores, condenava o uso de substâncias psicoativas e atribuía ao cogumelo o status de “coisa do diabo“. Como resultado desse contexto, ocorreu o esquecimento e a má reputação da tradição ancestral dos cogumelos sagrados.

Atualmente, pesquisadores em todo o mundo estão estudando novamente o cogumelo mágico, e reconhecendo-o como um elemento importante da cultura mesoamericana. No entanto, é crucial lembrar o impacto que a colonização espanhola teve na tradição do teonanacatl e como suas consequências ainda são sentidas até hoje.

Cogumelos mágicos no xamanismo mesoamericano

Os cogumelos sagrados mesoamericanos, tiveram um papel fundamental nas práticas xamânicas dessa região. Primordialmente, os xamãs eram detentores de um vasto conhecimento sobre as propriedades espirituais e medicinais desses cogumelos e os utilizavam tanto para si mesmos quanto para ajudar suas comunidades.

De acordo com as crenças dos xamãs mesoamericanos, os cogumelos com psilocibina possuíam o poder de abrir portais para reinos espirituais. Com eles poderiam obter visões que seriam usadas para orientar decisões e garantir a proteção nessas incursões. Além disso, acredita-se que o uso dos cogumelos permitia aos xamãs se conectar com os espíritos dos animais e elementos naturais, permitindo realizarem curas.

Ao utilizar os cogumelos, os xamãs passavam por uma jornada espiritual, em que precisavam enfrentar seus medos e problemas internos para alcançar a sabedoria e a cura. Essa jornada é conhecida como uma “busca da visão” e é uma prática comum em todo o mundo.

“Os cogumelos sagrados são como a medicina dos xamãs, que permitem acessar a cura e a transformação” – Carlos Castañeda

O uso de cogumelos psicodélicos pelos xamãs era extremamente ritualístico e envolvia a realização de preces e oferendas.

As comunidades consumiam os cogumelos sagrados somente em ocasiões especiais, como no início ou término de um ciclo agrícola, durante os solstícios e equinócios, ou em momentos de doença e dor.

Para os xamãs, o processo de encontrar e colher os cogumelos era tão importante quanto seu uso. Eles precisavam estar preparados espiritualmente e em harmonia com a natureza antes de ir em busca dos cogumelos sagrados. Acreditava-se até mesmo que o teonanacatl só se revelava para aqueles que mereciam seu poder sagrado.

Uso contemporâneo

A colonização e modernização da Mesoamérica praticamente extinguiram os rituais xamânicos originais, mas algumas partes do mundo ainda praticam o uso dos cogumelos mágicos como ferramenta terapêutica e espiritual.

Hoje em dia, muitas vezes associa-se o uso dos cogumelos mágicos à experimentação psicodélica e recreativa. No entanto, a compreensão da ligação entre os cogumelos sagrados e o xamanismo mesoamericano pode ajudar a trazer uma perspectiva mais profunda sobre a natureza espiritual desses fungos e seus efeitos em mente e corpo.

Maria Sabina e a popularização dos cogumelos sagrados

Maria Sabina, uma xamã mazateca do México, teve um papel fundamental na popularização dos cogumelos mágicos entre os não-indígenas. Em meados do século XX, Sabina começou a trabalhar com os cogumelos sagrados em cerimônias xamânicas, e rapidamente chamou a atenção de pesquisadores, artistas, jornalistas e escritores que buscavam experiências transcendentais.

Sabina foi uma das primeiras a permitir que não-indígenas participassem de seus rituais com cogumelos, e contou com a “ajuda” de Robert Gordon Wasson, um escritor e etnógrafo, para divulgar a prática. Como resultado, Wasson publicou um artigo influente na revista Life em 1957, que ajudou a popularizar o uso dos cogumelos mágicos em todo o mundo.

“Os cogumelos sagrados são o presente que os deuses deram ao meu povo. Eles trazem luz e dão vida à alma,” declarou Sabina no documentário María Sabina, mujer espíritu (1978).

Na década de 1960, a psilocibina e outras substâncias psicodélicas ganharam popularidade na contracultura dos Estados Unidos e da Europa, ao mesmo tempo, a permissão concedida por Sabina para a participação de não-indígenas em seus rituais, resultou em sua prisão e posterior expulsão de seu vilarejo, devido às consequências devastadoras que a popularidade na mídia causou à localidade. No entanto, ela continuou trabalhando com os cogumelos sagrados até sua morte em 1985.

Referências em cogumelos sagrados

Durante anos, a ciência tem tentado entender os componentes químicos e os efeitos desses cogumelos sagrados, incluindo a psilocibina encontrada neles. Richard Evans Schultes, renomado pesquisador em botânica e etnobotânica da Harvard University, contribuiu significativamente para o estudo dos cogumelos com psilocibina, sendo uma das grandes referências no tema.

As pesquisas de Schultes elucidaram a complexidade dos cogumelos sagrados e sua importância na cultura mesoamericana, ademais, ele realizou diversas expedições em busca de cogumelos psilocibinos nas Américas, documentando suas descobertas e estudando seu uso tradicional.

Através de suas pesquisas pioneiras, Schultes descobriu que o teonanacatl era uma parte essencial do xamanismo mesoamericano e uma importante ferramenta para o acesso aos reinos espirituais. Além disso, mesmo depois de sua morte, suas contribuições ainda são lembradas e honradas na comunidade científica.

Além dos estudos publicados por Shultes, existem outras obras importantes que você pode aprofundar o conhecimento e ampliar a compreensão dos cogumelos sagrados nas civilizações mesoamericanas. Entre as publicações mais significativas sobre o assunto, destacam-se:

Nome da obraAutor
Visionary Mushrooms of the AmericasRalph Metzner
God’s Flesh: Teonanacátl: The True History of the Sacred MushroomJan Irvin e Andrew Rutajit

Essas publicações detalham a história, o uso religioso e a compreensão científica desses cogumelos sagrados, incluindo o papel importante que eles desempenharam na espiritualidade e cultura mesoamericanas.

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